Sheila Sacs
Em sua recente visita a Israel, a jornalista catalã Pilar Rahola voltou a fustigar a esquerda mundial que nesta década tornou-se o bastiã das maledicências contra o Estado de Israel. Convidada para integrar o “3º Fórum Global para Combate ao Antissemitismo”, realizado em Jerusalém, a combativa defensora da causa judaica acusou a esquerda de destruir a civilização quando perdoa ou permanece calada diante das ideologias totalitárias das "ditaduras islâmicas".
Também culpou a esquerda de trair a modernidade ao se apaixonar por déspotas do porte do "islamofaciscta" Ahmadinejad e do "demagogo perigoso" Hugo Chávez, favorecendo ainda a cultura do ódio no momento em que "aplaude" os terroristas do Hamas.
A posição anti-Israel da esquerda ocidental é classificada por Rahola como uma imensa derrota moral de quem já foi paladino da liberdade e "das esperanças utópicas da sociedade". Lembrando que coube à esquerda, durante muito tempo, "monopolizar o conceito de solidariedade e progresso", ela estranha que não haja manifestações, em grandes cidades como Paris e Barcelona, "contra a escravidão de milhões de mulheres muçulmanas ou contra o uso de crianças-bomba nos conflitos onde o Islã está envolvido".
A essa derrota moral da esquerda, contaminada e encurralada pelos germes da intolerância, mentira e preconceito, somam-se outras derrotas importantes que desfavorecem o Estado Judeu e enfraquece as sociedades, segundo Rahola. Elas se localizam nas áreas da mídia (que informa mal), do pensamento crítico (banalização dos valores da civilização), da ONU (palco de ódio a Israel), da economia (dependência energética) e do próprio Islã, atacado internamente pelo fundamentalismo.
Em suma, uma derrota generalizada das forças sociais, políticas, econômicas e religiosas que regem as civilizações. Frente a esse cenário desolador de representações distorcidas produzidas ao longo dos primeiros dez anos do século XXI, Israel sobrevive como um "órfão" na visão da jornalista. "O pensamento intelectual e o jornalismo internacional renunciaram a Israel", lamenta Rahola. E põe o dedo na ferida - utilizando-se de uma lingüística crua, sem os disfarces habituais que a polidez social recomenda - ao evidenciar o Estado Judeu, nesse contexto de ruína moral, como a encarnação de "um pária de nação entre as nações, para um povo pária entre os povos".
O antigo ódio vestido de nova roupagem servindo-se do descaso e da falta de um efetivo comprometimento dos governos com os valores da liberdade e da cidadania.
Ainda que ao final da exposição a palestrante conclamasse as pessoas a não serem omissas e a jamais permanecerem sentadas vendo o mal triunfar, a frase impactante da forma como foi dita dificilmente seria repetida por israelenses ou pensadores de ascendência judaica de qualquer matiz ideológico para classificar a posição política de Israel e a situação dos judeus no mundo. Acredito que o pudor, o constrangimento e um mínimo de amor-próprio os impediriam desse autoflagelo público, quase um haraquiri psicológico.
Mas, despida de tais complexos de exceções que ainda fustigam as biografias dos judeus da diáspora e já batem à porta dos israelenses, a perspicaz jornalista em uma única sentença decretou a falência moral da humanidade. Afinal, que valores regulam uma civilização que por mais de dois milênios tem se mostrado, sistematicamente, impiedosa e implacável com um determinado grupo minoritário formado por seres humanos em tudo semelhantes aos demais do planeta? A fidelidade a uma religião ancestral e o respeito aos seus costumes e tradições fazem parte de um conjunto de princípios e padrões que tendem a moldar positivamente a identidade de cada um.
E quem faz a sociedade melhor são justamente os cidadãos de bem, quaisquer que sejam os seus credos. Portanto, de certo ponto de vista pode parecer um tremendo non sense que leis precisem ser instituídas para impor as populações um comportamento público de tolerância e compreensão em relação a determinadas minorias formadas por pessoas de bem. Essa lógica perversa e irracional que perdura e não parece dar sinais de arrefecer justifica o patético título da conferência de Rahola: “Judeus de seis braços” (em uma tradução bem cuidada de Irene Walda Heynemann).
Ou seja, nós judeus ainda somos percebidos pela humanidade como aberrações, tais quais as mulheres-macaco, os irmãos siameses e os homens-elefante que habitavam os picadeiros dos circos medievais. Uma pena. Afinal, com tantas mentes iluminadas em todos os campos do conhecimento ainda não fomos capazes de descobrir alguma fórmula para extirpar essa chaga medonha da face da humanidade. Mas, apesar disso, e talvez por isso mesmo, seremos mais irmãos e camaradas nos próximos 365 dias.
Com os olhos e ouvidos atentos, a mente lúcida, as mãos estendidas. Acreditando na amizade, no abraço, na solidariedade e na capacidade das pessoas se entenderem e se amarem sejam quais forem os seus destinos e as suas crenças.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário